O crocodilo - Fiódor Dostoiévski
Resenha:
O Crocodilo é um conto inacabado escrito por Fiódor Dostoiévski na cidade de São Petesburgo em 1864. O conto possui IV capítulos que em uma primeira leitura incomodam ao leitor atual por abordar a entrada do capital estrangeiro na Rússia da segunda metade do século XIX, sua modernização e sua tentativa de aproximação cultural em relação à Europa, de uma maneira surreal, porém que inclui discussões realistas com âmbito crítico.
A trama se desenvolve em torno de três personagens principais, Ielena Ivânovna esposa de Ivan Matviéitch e seu amigo de família - também narrador do conto - Siémion Siemiônitch. Ivan Matviéitch é uma espécie de funcionário público da Rússia czarista que tira licença para passar três meses viajando através da Europa, porém antes de viajar sua esposa pede para ver o crocodilo que estava sendo exibido na Passagem de São Petesburgo por um alemão.
Ivan consentiu o desejo da mulher e foi com ela e seu amigo o narrador para a Passagem, chegando lá e depois de pagar um quarto de rublo ao dono do estabelecimento, se depararam com o crocodilo em uma espécie de banheira com um pouco de água, ele não se movia. Após o pedido de Ielena o dono alemão o cutucou com um pauzinho e ele se moveu um pouco, soltando um resfolegar. Ielena achou o animal nojento e foi com Siémion observar os outros animais que estavam sendo exibidos no estabelecimento enquanto Ivan continuou junto ao crocodilo.
Pelo que nos narra o narrador Ivan estava cutucando o animal para que ele soltasse novamente o resfolegar quando o crocodilo o abocanhou e o engoliu. Todos ficaram imóveis, não sabiam como agir em uma situação daquelas, Ielena começou a gritar para que tirassem seu homem da barriga daquele crocodilo enquanto o dono do animal gritava por seu crocodilo. Nesta parte do conto começamos a perceber que Siémion não era muito chegado ao seu companheiro Ivan, chegando a ter pensamentos egoístas em relação à situação como este:
“(...)É verdade – pensava eu no momento fatal – se tudo isto tivesse acontecido comigo e não com Ivan Matviéitch, como seria desagradável!”[1]
O que havia dito acima que incomoda o leitor na obra de Dostoiévski é o fato de o alemão, sua mãe e todos os demais personagens que aparecem no decorrer do conto, menos Siémion, não pensam no ser humano que foi engolido por um crocodilo, e sim pensam em um crocodilo, que ao ser exibido em um país que não é o seu de origem, gera capital para seu dono que é um estrangeiro, e que pode morrer por ter engolido um ser humano, bloqueando o fluxo de capital e o futuro progresso russo, o que denominam princípio econômico. Como Dostoiévski fala repetidamente desse princípio econômico acredito que queira criticar essa visão não humanista da economia de capital que chega em seu país. Pois como afirma Boris Schnaiderman no prefácio da publicação lida, Dostoiévski demonstra uma repulsa a qualquer mudança do estado social vigente. E como este capital viria de fora, ou seja, através de estrangeiros o autor também o repulsa, pois é defensor das raízes e das produções nacionais e populares da Rússia.
Voltando ao conto em si, passa que Ivan não morre dentro do crocodilo, ao contrário se sente melhor e mais apto para pensar sobre as soluções dos problemas sociais, de estado, etc. E tem delírios sobre quantas pessoas o visitarão por dia, que fará discursos sobre a natureza das coisas, que será um estadista, entre outras coisas, seu amigo Siémion tenta manter o companheiro com os “pés no chão”, porém não tem sucesso e o ajuda como pode. O alemão se recusa a abrir a barriga do crocodilo porque este é de sua propriedade e ninguém havia pedido para que o russo entrasse em sua barriga, ainda mais que agora muito mais gente iria visitar seu estabelecimento e seus lucros iriam triplicar.
Acontece que aquilo que Ivan acreditava que seria grandioso se reverteu, nos jornais da cidade as notícias chegavam completamente desencontradas e uma delas chegou a chamá-lo de um bêbado que pretendia impedir o progresso do país, ademais de judiar do crocodilo que não teve outra saída a não ser “engoli-lo”.
Quando Siémion vai visitar outro companheiro para obter conselhos sobre como proceder este companheiro age como se o ocorrido lhe fosse merecido, pois só o que Ivan pensava era sobre o progresso, chegava a ser uma pessoa arrogante. Dostoiévski podemos dizer que nessa passagem determina o futuro dos progressistas de sua época.
“- Estou de acordo. Mas Ivan Matviéitch, no decorrer de toda a sua vida funcional, tendeu justamente para um resultado destes. Era vivo, arrogante até. Só tratava de progresso e de umas certas idéias, e eis aonde conduz o progresso!”[2]
Sobre Ielena a impressão que podemos captar da narração de Siémion é que ela é uma pessoa muito adorável, bonita, um pouco fútil, e que possui um caso enquanto seu marido está no interior do crocodilo, ela chega a se questionar sobre o divórcio agora que seu marido não mais receberá seu ordinário.
O conto se interrompe quando Siémion está indo em direção da Passagem para ler os artigos dos jornais que falam sobre o ocorrido com seu companheiro Ivan, deixando o leitor com a curiosidade de saber qual teria sido a reação de Ivan quando visse que seus planos não saíram como planejado.
Existem algumas passagens do conto que acredito que sejam importantes para serem comentadas devido a seu caráter de capitalismo selvagem, desumano e egoísta de ambas as partes, tanto da parte do engolido quanto da parte de seus expectadores.
“(...) Nós mesmos nos afanamos para atrais os capitais estrangeiros à nossa pátria, mas veja bem: mal foi atraído para o nosso meio, o capital do homem do crocodilo duplicou-se por intermédio de Ivan Maviéitch, e nós, em lugar de proteger o proprietário estrangeiro, queremos abrir a barriga do próprio capital de base. Ora, há coerência nisto? A meu ver, Ivan Maviéitch, como um verdadeiro filho de sua pátria, deve ainda alegrar-se e orgulhar-se com o fato de ter duplicado, ou talvez até triplicado, com a sua pessoa, o valor de um crocodilo estrangeiro. Isto é necessário para atrair os capitais(...)”[3]
Comentário feito com Timofiéi Siemiônitch, a quem Siémion foi pedir conselhos sobre como proceder com o ocorrido.
“(...)Serei assunto obrigatório tanto aqui como lá. Há muito ansiava por uma oportunidade em que todos falassem de mim, mas, tolhido de minha pouco importância e pelo posto subalterno, não o conseguia. Agora todavia, tudo isso foi alcançado pela simples tragada de um crocodilo. Cada palavra minha será ouvida, cada uma das minhas afirmações será pensada, transmitida, impressa. E eu hei de mostrar quem sou!(...)”[4]
Fala de Ivan Maviéitch, confirmando o que haviam dito sobre ele, um homem egoísta e arrogante.
Acredito que podemos analisar este conto de Dostoiévski como um conto crítico e cético em relação a esta nova maneira de formação de capital na Rússia ainda czarista. E também a esta atitude desumana frente a acontecimentos inesperados que é gerada pelo chamado capitalismo selvagem. Ainda podemos dizer que é um conto moralista por indicar o comportamento desregrado de Ielena Ivânovna. Não podemos nos esquecer que Dostoiévski não escapa de seu meio social e de sua época, e que estava respondendo a questões que lhe estavam postas, e se formos nos reter a maneira como abordou essa temática no conto O crocodilo, ele a abordou magistralmente, apesar de não o ter terminado.
[1] DOSTOIÉVSKI, Fiódor – O crocodilo e Notas de inverno sobre impressões de verão – tradução de Boris Schaiderman – São Paulo: Ed. 34, 2000, p.18.
[2] Idem, p. 28
[3] Ibidem, p. 33
[4] Idem, p. 41
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
Patrimonio e Folclore na cidade de São Paulo -parte II
Patrimonio e Folclore na cidade de São Paulo
Parte II
No presente trabalho partiremos da seguinte definição do que é folclore:
“(...) chegamos a encarar o folclore como compreendendo ‘todos os elementos culturais que constituem soluções usual e costumeiramente admitidas e esperadas dos membros de uma sociedade, transmitidas de geração a geração por meios informais’ e a supor que ‘do ponto de vista da sistematização dos dados folclóricos essa conceituação tem a vantagem de englobar elementos da cultura material, ergológica, como elementos da natureza não material’ (...)”[1]
Retomando o conceito de Patrimônio Imaterial definido pela Unesco, podemos afirmar que já que este tipo de patrimônio é transmitido de geração em geração e que este é recriado constantemente pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, o folclore também é uma representação deste Patrimônio Imaterial.
Como já havia sido discutido na primeira parte do trabalho preservar o patrimônio é de certa forma sacralizar o objeto ou a forma de expressão, retirando destas manifestações sua historicidade. É justamente este pensamento cristalizador que os denominados folcloristas possuem, de acordo com o pensamento do autor Florestan Fernandes em seu livro “O folclore em questão”.[2]
Para os folcloristas as manifestações populares/folclore devem ser preservadas, pois um dia estas irão desaparecer. O que não percebem é que as manifestações populares estão em constante movimento assim como o ser humano, sua consciência e concepção de mundo. Segundo Florestan Fernandes o folclore possui três funções, a de socializar, a de controle social, e a de preservar os valores sociais. Se estas manifestações mudam de caráter não faz mais sentido preservar seu caráter anterior, temos que nos lembrar que o folclore é uma forma de manifestação móvel que parte do saber popular – Folk = povo, lore = saber – portanto é uma manifestação que sempre será atual.
O que os folcloristas fazem é apropriar-se esteticamente do folclore para a classe erudita, mesmo fenômeno que ocorreu com o pensamento sobre Patrimônio Cultural, como já foi discutido acima. Eles apanham somente os aspectos estáveis do folclore, perdendo todo seu caráter contemporâneo que em pouco tempo tampouco será mais contemporâneo. Em outras palavras os folcloristas estudam basicamente as sobrevivências do modo sociabilizador. Entendem preconceituosamente os ‘meios populares’ como ‘grupos atrasados’. O que sabemos que não é uma realidade, pois os elementos folclóricos estão assentados em todas as classes sociais, seja pelas denominadas trocinhas infantis, seja pelos provérbios populares ou então pelos contos e cantigas de ninar. O folclore desta forma que é entendida se torna inteligível para aqueles que o criam e o transformam, ele perde sua significação e função.
Após esta breve problematização de como o folclore é entendido pelos folcloristas, passo agora a caracterizar o folclore paulista da maneira como este foi estudado pelo autor Florestan Fernandes na década de 1940.
Retomando as três funções que Florestan Fernandes acredita que tenha o folclore paulistano, a primeira delas é influência sociabilizadora. Para isto ele estuda a formação das “trocinhas” infantis formadas no bairro do Bom Retiro em São Paulo. As trocinhas são grupos que as crianças de uma mesma rua formam, para brincar/jogar. Elas são formadas por crianças mais ou menos da mesma idade, que possuem uma mesma concepção de mundo, e categoria social. Nestas trocinhas a criança não aprende somente a brincar e a jogar, ela também aprende que existem regras que precisam ser seguidas para que ela possa brincar, ela começa a distinguir várias reações do grupo em relação às suas ações e começa a se moldar ao grupo. Diz Florestan Fernandes que as trocinhas são uma sociedade em miniatura.[3] Nelas se aprende o valor da competição no caso das disputas em jogos de futebol entre as trocinhas, de companheirismo, de lealdade e amizade também. Quando a criança está com seus colegas suas relações passam a ser simétricas, e não assimétricas como quando ocorre quando estão em contato com adultos.
A segunda função é a do folclore como forma de controle social, aqui se encaixam os ditos e os provérbios populares. Estes podem ser usados em duas situações: quando estão recorrendo à experiência de seus antepassados, se identificam com a chamada “sabedoria popular”; ou então quando acreditam que dentro daquele provérbio está tudo dito, é a verdade expressa em poucas palavras. Quando as pessoas recorrem à experiência de seus antepassados recorrem também à força da moral, é a evidencia da prudência: a força da tradição.
Florestan Fernandes acredita que as famílias que recorrem mais a esta primeira situação de utilização dos provérbios são as de origem luso-brasileira, imigrante, e originárias do interior do Estado de São Paulo. Já as que recorrem à segunda situação são pessoas do segmento urbano, porém que também preservam traços da cultura tradicional.
A terceira e última função do folclore seria a de reintegração da herança social. Devido à rápida mudança e à brusca ruptura que ocorreu na cidade de São Paulo no século XX, o folclore acaba contribuindo para manter uma espécie de “oásis semi-rural” no interior da cidade.[4] Sendo importante para a integração social de novas personalidades que acabavam de se instalar na cidade, e também para perpetuar certas tradições.
Acredito que talvez uma solução para o problema dos folcloristas, que acreditam que é importante somente uma coleta de dados folclóricos, seja a datação destes para facilitar a análise deste banco de dados por cientistas sociais, antropólogos e até mesmo historiadores. O folclore revela muitas facetas da sociedade a qual ele está inserido, e um estudo comparativo entre o mesmo folguedo em diversas épocas pode também nos apontar em quais pontos a sociedade manteve sua tradição, e em quais pontos mudou socialmente.
Não penso que o folclore deva ser preservado e cristalizado pelo perigo de um dia ele acabar, ele não irá acabar somente mudará suas características como tem feito até os dias de hoje. Mas acredito que seja importante inventariar suas manifestações para futuros estudos comparativos.
BIBLIOGRAFIA:
Ø LEMOS, Carlos A C. – O que é patrimônio histórico – São Paulo: Brasiliense, 2004.
Ø CHOAY, Françoise – A alegoria do patrimônio – São Paulo, Editora UNESP, 2001.
Ø NOGUEIRA, Antonio Gilberto Ramos – Por um inventário dos sentidos: Mário de Andrade e a concepção de patrimônio e inventário – São Paulo, Hucitec, 2005.
Ø FERNANDES, Florestan – Folclore e mudança social na cidade de São Paulo – São Paulo: Martins Fontes – 2004.
Ø FERNANDES, Florestan – “O folclore em questão” – São Paulo – Martins Fontes – 2003.
[1] FERNANDES, Florestan – “O folclore em questão” – São Paulo – Martins Fontes – 2003, p. 14.
[2] Idem – discussão que permeia toda a obra.
[3] FERNANDES, Florestan – Folclore e mudança social na cidade de São Paulo – São Paulo: Martins Fontes – 2004 p. 19.
[4] Idem, p. 27
Parte II
No presente trabalho partiremos da seguinte definição do que é folclore:
“(...) chegamos a encarar o folclore como compreendendo ‘todos os elementos culturais que constituem soluções usual e costumeiramente admitidas e esperadas dos membros de uma sociedade, transmitidas de geração a geração por meios informais’ e a supor que ‘do ponto de vista da sistematização dos dados folclóricos essa conceituação tem a vantagem de englobar elementos da cultura material, ergológica, como elementos da natureza não material’ (...)”[1]
Retomando o conceito de Patrimônio Imaterial definido pela Unesco, podemos afirmar que já que este tipo de patrimônio é transmitido de geração em geração e que este é recriado constantemente pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, o folclore também é uma representação deste Patrimônio Imaterial.
Como já havia sido discutido na primeira parte do trabalho preservar o patrimônio é de certa forma sacralizar o objeto ou a forma de expressão, retirando destas manifestações sua historicidade. É justamente este pensamento cristalizador que os denominados folcloristas possuem, de acordo com o pensamento do autor Florestan Fernandes em seu livro “O folclore em questão”.[2]
Para os folcloristas as manifestações populares/folclore devem ser preservadas, pois um dia estas irão desaparecer. O que não percebem é que as manifestações populares estão em constante movimento assim como o ser humano, sua consciência e concepção de mundo. Segundo Florestan Fernandes o folclore possui três funções, a de socializar, a de controle social, e a de preservar os valores sociais. Se estas manifestações mudam de caráter não faz mais sentido preservar seu caráter anterior, temos que nos lembrar que o folclore é uma forma de manifestação móvel que parte do saber popular – Folk = povo, lore = saber – portanto é uma manifestação que sempre será atual.
O que os folcloristas fazem é apropriar-se esteticamente do folclore para a classe erudita, mesmo fenômeno que ocorreu com o pensamento sobre Patrimônio Cultural, como já foi discutido acima. Eles apanham somente os aspectos estáveis do folclore, perdendo todo seu caráter contemporâneo que em pouco tempo tampouco será mais contemporâneo. Em outras palavras os folcloristas estudam basicamente as sobrevivências do modo sociabilizador. Entendem preconceituosamente os ‘meios populares’ como ‘grupos atrasados’. O que sabemos que não é uma realidade, pois os elementos folclóricos estão assentados em todas as classes sociais, seja pelas denominadas trocinhas infantis, seja pelos provérbios populares ou então pelos contos e cantigas de ninar. O folclore desta forma que é entendida se torna inteligível para aqueles que o criam e o transformam, ele perde sua significação e função.
Após esta breve problematização de como o folclore é entendido pelos folcloristas, passo agora a caracterizar o folclore paulista da maneira como este foi estudado pelo autor Florestan Fernandes na década de 1940.
Retomando as três funções que Florestan Fernandes acredita que tenha o folclore paulistano, a primeira delas é influência sociabilizadora. Para isto ele estuda a formação das “trocinhas” infantis formadas no bairro do Bom Retiro em São Paulo. As trocinhas são grupos que as crianças de uma mesma rua formam, para brincar/jogar. Elas são formadas por crianças mais ou menos da mesma idade, que possuem uma mesma concepção de mundo, e categoria social. Nestas trocinhas a criança não aprende somente a brincar e a jogar, ela também aprende que existem regras que precisam ser seguidas para que ela possa brincar, ela começa a distinguir várias reações do grupo em relação às suas ações e começa a se moldar ao grupo. Diz Florestan Fernandes que as trocinhas são uma sociedade em miniatura.[3] Nelas se aprende o valor da competição no caso das disputas em jogos de futebol entre as trocinhas, de companheirismo, de lealdade e amizade também. Quando a criança está com seus colegas suas relações passam a ser simétricas, e não assimétricas como quando ocorre quando estão em contato com adultos.
A segunda função é a do folclore como forma de controle social, aqui se encaixam os ditos e os provérbios populares. Estes podem ser usados em duas situações: quando estão recorrendo à experiência de seus antepassados, se identificam com a chamada “sabedoria popular”; ou então quando acreditam que dentro daquele provérbio está tudo dito, é a verdade expressa em poucas palavras. Quando as pessoas recorrem à experiência de seus antepassados recorrem também à força da moral, é a evidencia da prudência: a força da tradição.
Florestan Fernandes acredita que as famílias que recorrem mais a esta primeira situação de utilização dos provérbios são as de origem luso-brasileira, imigrante, e originárias do interior do Estado de São Paulo. Já as que recorrem à segunda situação são pessoas do segmento urbano, porém que também preservam traços da cultura tradicional.
A terceira e última função do folclore seria a de reintegração da herança social. Devido à rápida mudança e à brusca ruptura que ocorreu na cidade de São Paulo no século XX, o folclore acaba contribuindo para manter uma espécie de “oásis semi-rural” no interior da cidade.[4] Sendo importante para a integração social de novas personalidades que acabavam de se instalar na cidade, e também para perpetuar certas tradições.
Acredito que talvez uma solução para o problema dos folcloristas, que acreditam que é importante somente uma coleta de dados folclóricos, seja a datação destes para facilitar a análise deste banco de dados por cientistas sociais, antropólogos e até mesmo historiadores. O folclore revela muitas facetas da sociedade a qual ele está inserido, e um estudo comparativo entre o mesmo folguedo em diversas épocas pode também nos apontar em quais pontos a sociedade manteve sua tradição, e em quais pontos mudou socialmente.
Não penso que o folclore deva ser preservado e cristalizado pelo perigo de um dia ele acabar, ele não irá acabar somente mudará suas características como tem feito até os dias de hoje. Mas acredito que seja importante inventariar suas manifestações para futuros estudos comparativos.
BIBLIOGRAFIA:
Ø LEMOS, Carlos A C. – O que é patrimônio histórico – São Paulo: Brasiliense, 2004.
Ø CHOAY, Françoise – A alegoria do patrimônio – São Paulo, Editora UNESP, 2001.
Ø NOGUEIRA, Antonio Gilberto Ramos – Por um inventário dos sentidos: Mário de Andrade e a concepção de patrimônio e inventário – São Paulo, Hucitec, 2005.
Ø FERNANDES, Florestan – Folclore e mudança social na cidade de São Paulo – São Paulo: Martins Fontes – 2004.
Ø FERNANDES, Florestan – “O folclore em questão” – São Paulo – Martins Fontes – 2003.
[1] FERNANDES, Florestan – “O folclore em questão” – São Paulo – Martins Fontes – 2003, p. 14.
[2] Idem – discussão que permeia toda a obra.
[3] FERNANDES, Florestan – Folclore e mudança social na cidade de São Paulo – São Paulo: Martins Fontes – 2004 p. 19.
[4] Idem, p. 27
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
A toa
"Embora estejam transportando você, se procupem com você e de vez em quando até o embalem tanto que, parece, não há mais o que desejar, apesar de tudo uma angústia o invade, e esta angústia procede justamente do fato de que você mesmo não faz nada, porque cuidam demais de você, e você tem que ficar sentado, esperando que o levem ao destino." Dostoiévski, Notas de inverno sobre impressões de verão.
Assinar:
Postagens (Atom)